Anatomia Da Viola
A viola compõe-se das seguintes partes: caixa de ressonância, boca, braço e palheta.
CAIXA DE RESSONÂNCIA
A caixa de ressonância é conhecida pelas seguintes designações: caixa, bojo, ou corpo. A caixa é composta de um aro e duas tampas. O aro pode ser inteiriço, ou em dois pedaços, sendo coladas as suas extremidades quando na forma, ficando a emenda embutida no taco de segurança do cavalete. Usam cola vegetal de sumbaré. O aro é que tem as curvas. Para execução dessas curvas, uns fabricantes usam formas, outros fazem a "olho" Aliás o "olhômetro" é o grande aparelho de precisão com patente nacional brasileira.
Na tampa da frente, ou "peito da viola", ficam o cavalete e a boca, isto é, uma abertura, que põe em comunicação a caixa de ressonância com o exterior. Paralelamente ao cavalete fica o rastilho, peça não fixa de taquara. A tampa posterior ou "costa" é inteiriça, uma tábua só sem emenda.
Na construção da caixa de ressonância entram as seguintes peças: 3 travessas para sustento da tampa posterior, 2 travessas para sustento da tampa anterior, taco de segurança do cavalete, armação para o braço (ficando para o lado de fora o gastalho). O aro, onde internamente são grudadas as viras de filete, para resistência, ou contra-fortes, onde serão coladas as tampas.
Empregam-se as seguintes madeiras no aro: guaiuvira (preferivelmente), jacarandá, canela saçafrás. A espessura do aro é de 2 mm. Nunca é mais grosso porque a madeira tem que entrar na forma fazendo as curvas, quanto mais fina, mais flexível. As tampas são feitas preferivelmente de pinho, porque dá maior sonoridade. O tampa das costas às vezes pode ser feita de cedro ou canela, mas a da frente sempre é de pinho. Devem ser madeiras bem secas. Dizem que a madeira deve ser cortada na lua minguante de mês que não tem "r" para durar mais, ser flexível e também não carunchar. As tampas que são de 2 a 3 mm de espessura, geralmente feitas de tábua de caixão de pinho. O fabricante entrevistado costuma comprar caixões, desmancha-os e guarda as tábuas num lugar seco durante 2 ou mais anos, "pra ficá cum mais alma", isto é, melhor som. Primeiramente, antes da guerra, o Sr. Zico Brandão, famoso fabricante, adquiria caixões de pinho de Riga, que davam as melhores violas que até hoje fabricou.
A largura do bojo é de 25 centímetros, onde se cola o cavalete, e a menor é de 18 centímetros, na parte inferior deste, no centro da cintura que dá um pequeno estrangulamento fica a abertura, a boca.
A caixa de ressonância às vezes é invernizada. No pequeno tamanho da caixa de ressonância da viola paulista, em contraste com o grande tamanho da caixa da viola do litoral, é que reside boa parte da diferença entre estes dois tipos de viola.
BOCA
A abertura que põe em comunicação a caixa de ressonância com o exterior é a "boca". A boca da viola pode ter diversas formas, sendo a mais comum em forma de coração para as feitas à mão, e circulares, as estandardizadas pela máquina.
Outros tipos de "boca" encontradas entre as violas feitas à mão: dois corações, estrelas, coração e raramente o losangular.
Ao redor da "boca" é costume fazer alguns desenhos ou encastoar malacacheta. Os desenhas são pirogravados. No litoral encastoam pedaços de conchas, e no serra-acima, malacacheta.
Os desenhos, "enfeito" como dizem, em geral são pirogravados, mas também temos encontrado feitos a lápis, tinta de escrever, e em Piracicaba, uma riquíssima viola com uns desenhos a óleo e o apelido daquela cidade, "Noiva da Colina".
Há violeiros que mandam escrever seus nomes ou apenas iniciais. Outros, algumas frases, nome de mulher. Zico Brandão pirogravou em sua viola: "Os reis da viola", ao lado do desenho de um "pinheiro". Flores estilizadas, em geral é o "enfeito" mais encontrado.
BRAÇO e PALHETA
A haste ou "braço" compõe-se de duas partes distintas: braço e palheta. Muitos violeiros chamam aos dois tão somente de braço. Aliás, na viola há muitos nomes das partes do corpo humano usados para denominações e isso revela que o nossa caipira empresta ao instrumento predileto um pouco da anatomia humana: boca, "cacunda" ou costa, braço, pestana, cintura, ilharga, cabeça da tarraxa e o mais importante é que a viola tem alma. E o inverso também serve para comparação: moça bonita de corpo bem proporcionado é "corpo de viola", e. . . com as nádegas um pouco avantajadas é "corpo de violão", ou "cintura de violão".
Mas, voltemos ao braço da viola. Nele estão os trastos ou pontos, divisões de metal. Na parte superior do braço está a palheta e como já apontamos ela é enfeitada, lisa ou "trabalhada".
Na palheta estão os artifícios onde se ajustam as cravelhas para a afinação. Cravelha vem do latim, clave, que deu chave, "clavelha", chave pequena e ficou cravelha. Nela distinguimos três partes distintas: orelha ou chapinha, corpo e pique ou furo onde a corda é enroscada ou enfiada.
Quando nos referimos ao número de cordas, convém lembrar que há uma diferença entre as violas do litoral (tipo angrense) e nas quais os caiçaras usam apenas 7 cordas. Nestas violas (Cananéia, Iguape, etc.), é comum encontrar-se uma outra corda que não atinge o braço todo e a cravelha não se aloja na palheta; há, grudado por fora do gastalho um pequeno dispositivo onde está a pequena cravelha. A este conjunto chamam de "piriquito" ou benjamim (ver figura abaixo). Nas violas do litoral há portanto uma pequena corda (a oitava), chamada cantadeira, fica acima do contra-canotilho e afinada em uníssono com o contra-bordão ou melhor, contra- canotilho. No serra-acima paulista, principalmente nas zonas antigas onde não há influência nordestina ou outras, o que se dá realmente nas zonas pioneiras, novas, os caipiras usam encordoar as suas violas com uma dezena de cordas. Dizem que a viola tem dez cordas, porque dez são dedos da mão. No entanto já vimos violas com 12 cordas e até 14 como aquela célebre feita por Zico Brandão de Tatui - "o rei da viola", cuja caixa de ressonância era feita de casca de um tatú-etê. Viola que merecia figurar num museu.